Pecuária
Com o segundo maior rebanho bovino do país, totalizando 26 milhões de cabeças, e um crescimento de áreas de pastagem de 150% em 20 anos, o Pará enfrenta desafios ambientais significativos, como desmatamento ilegal e grilagem de terras. Para aumentar a transparência e o desenvolvimento sustentável da cadeia, foi criado em 2023 o Programa de Integridade e Desenvolvimento da Cadeia Produtiva da Pecuária do Pará, que inclui um sistema obrigatório de rastreabilidade individual do gado. A iniciativa busca apoiar a regularização ambiental e fundiária, enquanto intensifica apoio aos produtores, facilitando maior adesão por meio de incentivos e desenvolvimento produtivo.
Segundo um estudo da Bain & Company e a The Nature Conservancy, a rastreabilidade individual obrigatória pode aumentar o valor da produção pecuária anual no Pará em até US$1 bilhão nos próximos três a cinco anos, além de reduzir perdas devidas a interrupções sanitárias. Para chegar a esta estimativa, as empresas analisaram 18 mecanismos possíveis e chegaram à conclusão que o pagamento direto a produtores por cabeça de gado rastreado se destaca nesse estudo. Conforme estimativas, essa bonificação demandaria até US$ 58 milhões em investimentos anuais.
As principais alavancas de crescimento incluem:
Aumento das exportações de carne bovina rastreada: um crescimento no mix de exportação de carne bovina na ordem de 4% de aumento a 10% poderia ampliar a produção pecuária no Pará em US$ 115 milhões a aproximadamente US$ 230 milhões;
Crescimento da demanda e preço no mercado interno brasileiro: um aumento de 3% a 8% no preço de venda da arroba poderia aumentar o valor da produção de gado no estado em cerca de US$ 70 milhões a US$ 160 milhões;
Redução no mercado informal: uma queda de 50% a 80% da parcela de carne vendida para o mercado informal poderia aumentar o valor da produção de gado de US$ 200 milhões a US$ 330 milhões;
Aumento da produtividade: ampliar a produtividade de 5% a 10% devido ao melhor manejo do gado rastreado pode aumentar o valor da produção em US$ 112 milhões a US$ 224 milhões.
Grandes produtores tendem a adotar a rastreabilidade com mais facilidade, pois percebem os benefícios diretos em gestão e acesso a mercados. Em contraste, pequenos produtores e aqueles em imóveis rurais com desmatamento (responsáveis por quase 50% do rebanho paraense) enfrentam maiores barreiras para adesão, principalmente devido ao custo elevado de regularização ambiental e do receio de marginalização. Fábio Medeiros, diretor de parcerias estratégicas em pecuária da TNC, ressalta: “Se por um lado, o programa promove transparência e rastreabilidade, por outro, a iniciativa incentiva a regularização comercial dos produtores quanto a passivos ambientais. Como consequência, eles voltam mais rapidamente ao mercado formal, reduzindo práticas que dificultam o acompanhamento e o controle eficaz da cadeia produtiva”.
Hoje, boa parte dos imóveis rurais no Pará apresenta irregularidades causadas pelo desmatamento ilegal. Estima-se que pelo menos 50% das cabeças de gado no estado estejam em propriedades com problemas ambientais relacionados ao desmatamento.
Aproximadamente 88% das propriedades com o registro de CAR de imóveis irregulares com atividade pecuária são pequenos imóveis rurais e assentamentos, totalizando mais de 100 mil propriedades que abrigam quase 6 milhões de cabeças de gado. Já os médios e grandes imóveis com irregularidades ambientais abrigam quase 8 milhões de cabeças de gado em mais de 14 mil propriedades.
O sucesso na implementação de intervenções na cadeia de valor da pecuária geralmente está ligado ao aumento da segurança sanitária, à melhoria da qualidade dos produtos e à adoção de práticas sustentáveis e de rastreabilidade animal. Isso depende frequentemente de apoio e mecanismos viabilizadores da adoção de melhores práticas produtivas, especialmente pelos elos mais vulneráveis da cadeia.
Para promover a adesão a essas intervenções, é comum criar mecanismos que ofereçam benefícios financeiros e não financeiros, visando impulsionar produtores rurais e agricultores, garantindo uma transição suave para novos requisitos sociais, produtivos e ambientais.
“Dada a complexidade do atual cenário da produção pecuária no Pará, mecanismos viabilizadores bem estruturados e a cooperação entre governo, setor privado e pecuaristas serão cruciais para alcançar resultados consistentes, equilibrando produtividade, sustentabilidade e competitividade no setor”, explica Carlos Líbera, sócio da Bain que integrou a equipe responsável pelo estudo. “A articulação entre essas partes deve auxiliar na superação de barreiras e assegurar que os benefícios das intervenções sejam amplamente distribuídos ao longo da cadeia de valor ", comenta.
A implementação dessas práticas não se limita a atender às demandas do mercado, mas também representa um passo estratégico para fortalecer a economia local e promover a sustentabilidade. Melissa Brito, chefe de estratégia de conversão zero de Commodities da TNC, ressalta que avançar com o programa de rastreabilidade é uma oportunidade de agregar valor ao Estado do Pará. “É possível produzir e, ao mesmo tempo, preservar a floresta em pé. Às vésperas da COP 30, implementar em escala um programa como este, atrelado à redução do desmatamento na Amazônia, representa uma ação pioneira e definitiva para o Brasil”, conclui.
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